Vozes e violão. Os mais sensíveis garantem que são deste plano e do outro plano. E uma imensa difusão de energia em torno do trabalho musical do Grupo de Arte Tim e Vanessa, que aos poucos ganha espaço no movimento espírita, com foco na simplicidade e na valorização das letras que transportam a quem se entregue a ouvi-las, aos tempos do Evangelho.
Eles reúnem em torno de si um forte apoio dos amigos e participantes da Mocidade do Grupo Espírita O Consolador e também de pessoas vinculadas à arte, que conheceram há 13 anos, participando do Encontro de Arte Espírita Estradas.
Acostumados a se apresentar na região da capital mineira, o Grupo Tim e Vanessa não imaginava que as músicas que compõem seus três CDs fossem tão conhecidas no movimento espírita. Depois de se apresentarem, em São Bernardo do Campo, no auditório da Instituição Assistencial Meimei, em prol do Projeto Descoberta, o grupo se reuniu para conceder entrevista ao Correio Fraterno, o que acabou se tornando uma grande oficina de reflexão em torno do tema Arte Espírita.
Como apareceu Tim e Vanessa ?
Tim (Walter Santos) – Eu já compunha várias canções, participando do Encontro Grupo Estradas, que se reunia em BH uma vez por ano, no carnaval. Mas passados dez anos, resolvemos gravar essas canções em um CD – O senhor das estrelas – para angariar recursos para a casa O Consolador, em que participo. Nossa meta era conseguir vender 300 cópias, e felizmente, em pouco espaço de tempo, tivemos que gravar mais CDs. Não esperávamos. Foi como um chamamento para olharmos tudo isso com mais carinho.
Em 2002, precisavam de um outro violão que fizesse o solo. Denis Soares chegou e superou, não por apenas tocar bem, mas pela afinidade com o trabalho. Acho até que ele tem mais consciência da tarefa do que eu.
Júlio Adriano (compositor e quem realiza a produção do CDs) – Tínhamos pastas e pastas com letras de músicas que a Mocidade compunha. Sempre estávamos lá no Estradas: eu, Tim, o Willi de Barros. O primeiro CD – O senhor da estrelas – foi uma catalogação das músicas que já estavam sendo cantadas.
O que é arte para o movimento espírita?
Tim – Poderia dizer que é uma porta aberta para que a gente possa entender com mais clareza os ensinamentos e as vivências evangélicas de uma forma mais sublimada. A música nos remete a planos superiores de reflexão. Isso facilita a captação de alguns aspectos que a gente muitas vezes não alcança pelas palavras.
As letras das músicas que cantam são profundas, numa rara qualidade poética. Quanto há de transpiração e quanto de inspiração?
Tim – A inspiração vem de uma forma muito natural e chega quando a gente recebe uma letra para pôr melodia, ou tem vontade de escrever sobre determinado tema. Há alguma transpiração na hora de fazermos nossa parte, um encaixe na harmonia, uma forma de tocar, mas a música já está pronta na mente. A transpiração mesmo vem na hora em que a gente mostra para o público aquela idéia musical. O compartilhar é muito gostoso. Há uma grande transpiração coletiva.
Como vocês se preparam para as apresentações?
Tim - Nós sempre conversamos muito sobre o objetivo desse trabalho. Procuramos nos concentrar e lembrar que o trabalho não é nosso. É um instrumento de divulgação da doutrina, uma tarefa. Nós não somos artistas. Existe sim a facilidade para se cantar. Temos a preocupação de nos preparar, nos conectar e também a preocupação de não perder o vínculo com a casa espírita, com o estudo do Evangelho, chamado em Belo Horizonte de miudinho, e com a tarefa da evangelização. Tudo isso é que mantém a chama acesa.
Vocês têm notícias do trabalho espiritual que acontece no decorrer da apresentação?
Vanessa Carvalho – Sim. Recentemente nós fizemos uma apresentação dentro da Campanha de Popularização da Arte Espírita, em Belo Horizonte e tivemos informações de equipes espirituais que, com recursos retirados do palco, realizavam os atendimentos.
Quem ouve os CDs, já que eles trabalham fortemente os temas do Evangelho?
Vanessa – A maioria é de espíritas. Mas temos conhecimento de muitas pessoas que presenteiam amigos, como uma tia que fez de presente a um padre, que gostou e pediu outro CD para passar a um amigo do seminário. Muitos evangélicos também gostam. Tivemos um encontro de corais em Santa Luzia-MG, com um coral católico, uma regente evangélica. Foi muito bom, por que as pessoas sentem que é a mensagem evangélica que está sendo levada.
Sheila Passos (autora e editora de livros infantis) – Acho que nós, como espíritos eternos, já estagiamos muito no catolicismo, protestantismo, onde buscávamos uma compreensão da Bíblia. Quando chegam essas músicas com essa consistência, elas entram preenchendo esse espaço. Cada um é tocado por uma música especial, de forma diferente.
Músicas preferidas ?
Vanessa – São como filhos, impossível de se dizer de qual se gosta mais. Em cada momento tem uma música que toca mais. Fiquei muito tempo com a música O senhor da estrelas na cabeça. Fui fazendo um trabalho em mim. Primeiro, num registro inicial quando foi levada no Grupo Estradas, e depois com o arranjo para o CD gravado em 99. Hoje a música que tem mais trabalhado em mim é Aos pés do monte. Mas amo todas.
Tim – Minha música preferida hoje, por que foi fruto de uma necessidade íntima, é a mais nova Que assim seja, ainda não está registrada em CD.
Normalmente são casas espíritas que convidam vocês para apresentações?
Tim – Somos chamados para várias coisas: casamento, formatura, porque as pessoas não têm noção de que seja arte espírita. Aí a coisa acontece. Acho muito legal. Apenas acho que, como divulgadores, temos que atentar para que o ambiente seja adequado, para que a gente possa ser instrumento do trabalho que Vanessa comentou. Porque senão vai ser um mero show e não é o nosso objetivo.
Os jovens não-espíritas têm sido tocados pela música de vocês?
Tim - Nós temos retorno, sim. Por todo um contexto, ela não quer ser só do espírita. Vemos crianças cantando músicas que eu acho difícil. Outros dizem que colocam a música Parnaso de Além-Túmulo para a criança dormir, dizendo que ela gosta. Converso muito com Vanessa e digo que 50% a gente realiza, os outros 50% a espiritualidade realiza. Por isso que a gente tem que ter muita responsabilidade. Para não comprometer a parte que não nos cabe.
Júlio – A arte sempre foi a expressão do saber, do anseio. Quando a gente começa sentir a qualidade de trabalhos como esse que vêm influenciando Minas, falando tanto de Jesus e do Evangelho – o que é raro no movimento, porque se eu falo de Jesus, a música fica parecendo vinculada a casas protestantes, carregada de religiosismo – fico pensando que já é esse anseio das pessoas de encontrar sintonia num tipo de arte diferenciada. É a expressão de uma nova consciência.
É um trabalho filantrópico. Como vocês conciliam vida familiar, profissão e viagens?
Tim – É bastante difícil. Realmente temos que ter jogo de cintura, porque trabalhamos o dia todo e para realizar uma viagem temos que negociar muito. A gente não faz muitas viagens longas. Contamos mesmo com os finais de semana, férias. À noite em BH conseguimos atender a demanda. Agora começamos a rodar mais [Vanessa trabalha em empresa de Engenharia e Tim como programador visual].
Quais os novos projetos?
Tim – Existe o projeto do novo CD, mas deve surgir naturalmente. Quando a gente sente a vontade, a gente senta, toca aquela idéia e a coisa nasce. Já tivemos um pessoal propondo para gravarmos em inglês, e esperanto para atender melhor ao mercado. Os brasileiros que estão fora e gostam querem mostrar para os de lá. A gente protela para um momento futuro. Um dos problemas que enfrentamos são as letras, com termos que não encontram similaridade em outra língua e que numa tradução se perderia. Terá que ser versão. Mas o DVD já é um projeto não tão para o futuro, talvez para o ano que vem.
O que falaria para quem se identifica com a tarefa e tem talento para também realizá-la?
Tim – Ainda muito há por vir. A gente pode "estar precursores", numa linha diferente de composição. Mas espero que outros venham fazer um trabalho ainda maior, não de ser novidade. A novidade não existe. Mas que sejam verdadeiros e que traduzam a nossa necessidade, como seres em evolução.
Vanessa – Nós não tínhamos pretensão, nem noção do alcance do trabalho. O ideal é que as pessoas envolvidas sejam despertadas e procurem se manter dentro do objetivo do trabalho, estudando cada vez mais, procurando se informar sobre a influência da arte, perguntando-se como estão envolvendo quem as ouve. A sustentação está na resposta dessas questões e no vínculo com as tarefas na casa espírita, no sentir se o trabalho está fazendo transformação primeiro em si. A gente nunca pode deixar de se ver falível. Em treze anos, tenho consciência de que já melhorei muito, não apenas em expressão vocal. O objetivo é eu passar a mensagem da melhor forma possível e ir afinando o meu instrumento.
Júlio – É preciso lembrar do potencial de cada um. Gladston Lage - autor de muitas letras cantadas por Tim - é pedagogo, tem excelentes referenciais de cultura e costuma dizer que as letras que compõem são para ser refletidas. Algumas palavras são bastante incomuns e vêm como um estímulo para o nosso estudo.
Tim – Quando vou cantar uma música, já tive que estudar bastante o contexto, as palavras. Há um cuidado muito grande.
O que acontece em Arte Espírita pelo Brasil?
Tim - Nós ainda não fazemos muito intercâmbio. Sei do pessoal que trabalha com arte, mas a experiência deles eu gostaria de conhecer. Temos o César Tucci, Flávio X , Moacir Camargo, expoentes de São Paulo. Precisamos ter mais vínculo. Talvez essa nossa ousadia de começar a sair para São Paulo, Bahia, Rio, sirva para plantar, levar essa idéia: olha, eles estão abertos para trocar. Tem muita gente que chega, como o pessoal de Divinópolis-MG, para trocar idéias, que querem fazer um trabalho consistente.
Sheila: Em teatro a muita coisa boa acontecendo, como a Companhia Espírita Laboro, de (BH?) que tem sido bastante referência para nós. Utilizam recursos simples, que podem ser usado dentro de salas, com textos cuidadosamente realizados. Eles são divertidos, bem humorados, mesmo sem ser comédia. São muito bons.
Quais os maiores desafios?
Júlio – Existe muita coisa que é nova para a gente. Pela facilidade de se gravar um CD, ficou muito mais fácil a difusão do trabalho, mas também por conta desta facilidade, há que se ter cuidado e respeito em todos os sentidos, principalmente respeito pelos autores. Existe uma idéia um pouco generalizada de que música espírita não tem dono. As pessoas se fazem de autores das músicas, alteram as letras, regravam. A gente julga que é até por ingenuidade. Não atinam com relação a cópias, de CDs, esquecendo-se de que na maioria das vezes aquele trabalho sustenta uma obra.
Tim – Estamos pensando na realização de um seminário – até num primeiro momento exclusivo de música, por ser arte mais popular – para discutirmos um pouco isso.
Júlio – É sempre importante salientar que se trata de música espírita, e embora o conceito ainda seja amplo, isso reforça a idéia da responsabilidade, do belo e do bom, do ser coerente, ético. Isso é responsabilidade e deve ser aplicado o tempo todo, inclusive na postura de quem escreve o que vai ficar registrado e ser cantado o tempo todo. É um lance sério. Nós da arte espírita temos sim que difundir o que estamos fazendo e ter abertura para trocas, discussões, porque falamos em nome da doutrina e não em nome da gente.
Como fazer arte com qualidade?
Atrás de tudo para mim esta o estudo da doutrina. Tim compõe, mas antes está suando em cima dos livros. Foram muitos anos de transpiração até escrever Verbos, Pedro. É lógico que a inspiração existe, mas é preciso da bagagem para se colocar as idéias e entender se está correta e coordenada. Quando vemos uma arte com essa qualidade, é a doutrina transformando o artista, e não o artista acrescentando à arte. A música, o teatro e outras expressões artísticas, como a performance realizada pela dançaria Paola em nossa apresentação na música História de Madalena. Foi de emocionar. São formas de impressões que temos que utilizar com ferramentas para passar a mensagem. As pessoas precisam se sentir motivadas para estudar refletir sobre a letra e entender o processo. Olha a responsabilidade nossa, que vamos receber essa geração que já vem preparada. Estamos fazendo a nossa parte? ( http://www.timevanessa.com.br/ e http://www.fazendobem.com.br/cacau)
extraído do site do Correio Fraterno